Remessas ao exterior em pagamento pela prestação de serviços – não retenção do imposto de renda

Há muito se discute a necessidade de retenção do Imposto de Renda (IRRF) sobre remessas ao exterior pela prestação de serviços técnicos em que não haja transferência de tecnologia a residentes em países com os quais o Brasil possua tratado para evitar “bitributação”.
Apesar de alguns acordos preverem que o lucro das empresas estrangeiras, somente são tributáveis nos países em que estas “residirem” (exceto nos casos em que haja estabelecimento permanente no Brasil), a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) e a Receita Federal do Brasil (RFB), por meio do Ato Declaratório Normativo Cosit nº 01/00 e do Parecer PGFN/CAT nº 776/11, exararam entendimento de que os tratados firmados não se aplicavam a estes casos.
Como fundamento para este entendimento, sustentavam que as remessas ao exterior não deveriam ser qualificadas como lucro do prestador de serviços, mas sim como receita. Desta forma, tratando-se de rendimentos não expressamente mencionados nas Convenções, estes deveriam sofrer retenção no Brasil segundo a previsão contida no art. 7° da Lei n° 9.779/99, regulamentado pelo art. 685, II, alínea “a”, do Decreto 3.000/99, ou seja, com IRRF à alíquota de 25%.
Por meio da Nota Cosit nº 23/13, exarada pela RFB em resposta à manifesta intenção do Governo Finlandês de apresentar denúncia do acordo para evitar a dupla tributação firmado com o Brasil, na hipótese de se confirmar entendimento favorável à retenção no Brasil nas remessas em pagamento por serviços técnicos realizados na Finlândia, reconheceu-se a necessidade de revisão dos fundamentos do Ato Declaratório Normativo COSIT nº 01/00. Destaque-se que recentes decisões do Poder Judiciário brasileiro (i. e. RE 1.161.467/RS) têm sido contrárias ao entendimento original da RFB, o que favoreceu o cenário para uma reavaliação do tema pelo Poder Executivo.
Nesse sentido, por meio do Parecer PGFN/CAT nº 2.363/13, a PGFN reformou seu entendimento, reconhecendo que o termo “lucro da empresa estrangeira” deve ser interpretado como “lucro operacional”, este compreendido como “o resultado das atividades principais ou acessórias, que constituam objeto da pessoa jurídica” (art. 11 do Decreto-Lei 1.598/77), incluído nesse conceito o rendimento pago ao exterior como contrapartida de serviços técnicos em que não haja transferência de tecnologia.
Vale destacar que o entendimento exarado no referido Parecer encontra-se alinhado com a posição adotada pela grande maioria dos países signatários de tratados internacionais para evitar “bitributação” e vai, justamente, ao encontro do posicionamento adotado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (“OCDE”).
Considerando a recente publicação da Instrução Normativa RFB nº 1.455/14 e, ainda, o fato de que até o presente momento não se tem notícia da revogação do Ato Declaratório Normativo Cosit nº 01/00, tudo isso combinado com a ausência de publicação de Ato que aprove o entendimento do Parecer PGFN/CAT nº 2.363/13 pelo Ministério da Fazenda, entendemos que deve ser avaliada com cautela a possibilidade de as empresas nacionais deixarem de reter e recolher o IRRF sobre remessa de pagamentos pela prestação de serviços técnicos em que não haja transferência de tecnologia, a residentes em países com os quais o Brasil possua tratado para evitar “bitributação” nos moldes acima tratados.
Não obstante, evidentemente, estamos diante de uma real oportunidade (seja administrativa ou judicialmente) para a não retenção e recolhimento, assim como para recuperar os valores de IRRF indevidamente retidos, devendo ser avaliado nesse caso quem assumiu o ônus do imposto para se determinar a legitimidade ativa para o exercício do respectivo direito.

*Fernando Quaresma (fpq@localhost) e Marcelo Pissetti (msp@localhost) são advogados do escritório Marins e Bertoldi

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