Parecer 202 e os dividendos ou lucros distribuídos aos sócios

O Parecer nº 202 de 2013, da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN), declarou que a parcela de lucros ou dividendos distribuídos aos sócios “que exceder ao valor apurado com base na escrituração, será imputada aos lucros acumulados ou reservas de lucros de exercícios anteriores, ficando sujeita a incidência do imposto de renda calculado segundo o disposto na legislação específica, com acréscimos legais.”

Contrariamente ao acima disposto, a Lei n° 9.249 de 1995 em seu art. 10, dispõe quanto à não incidência do imposto de renda na fonte, a saber:

“Art. 10 Os lucros ou dividendos calculados com base nos resultados apurados a partir do mês de janeiro de 1996, pagos ou creditados pelas pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real, presumido ou arbitrado, não ficarão sujeitos à incidência do imposto de renda na fonte, nem integrarão a base de cálculo do imposto de renda do beneficiário, pessoa física ou jurídica, domiciliado no País ou no exterior.”

Por outro lado, as Leis n.° 11.638/2007 e 11.941/2009 (RTT), trouxeram modificações à Lei 6.404/1976 (Lei das S/A), onde as sociedades passaram a ter que apurar seu resultado com base na legislação societária observando critérios contábeis novos, sendo que estes não devem produzir efeitos tributários.

O Regime Tributário de Transição (RTT) foi criado pela Medida Provisória n° 449/2008, posteriormente convertida na Lei n° 11.941/2009. Trata dos ajustes tributários decorrentes dos novos métodos e critérios contábeis e visa alinhar a legislação, em sua essência, com os padrões internacionais de contabilidade. Na ocorrência de disposições da lei tributária que conduzam ou incentivem a utilização de métodos ou critérios contábeis diferentes daqueles determinados pela Lei nº 6.404/1976, a pessoa jurídica sujeita ao RTT, deverá adotar o procedimento previsto no art. 17 da Lei nº 11.941, de 2009 que dispõe:

Art. 17. Na ocorrência de disposições da lei tributária que conduzam ou incentivem a utilização de métodos ou critérios contábeis diferentes daqueles determinados pelaLei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, com as alterações da Lei nº 11.638, de 28 de dezembro de 2007, e dos arts. 37 e 38 desta Lei, e pelas normas expedidas pela Comissão de Valores Mobiliários com base na competência conferida pelo § 3º do art. 177 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, e demais órgãos reguladores, a pessoa jurídica sujeita ao RTT deverá realizar o seguinte procedimento:

I – utilizar os métodos e critérios definidos pela Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, para apurar o resultado do exercício antes do Imposto sobre a Renda, referido no inciso V do caput do art. 187 dessa Lei, deduzido das participações de que trata o inciso VI do caput do mesmo artigo, com a adoção:

a) dos métodos e critérios introduzidos pela Lei nº 11.638, de 28 de dezembro de 2007, e pelos arts. 37 e 38 desta Lei; e

b) das determinações constantes das normas expedidas pela Comissão de Valores Mobiliários, com base na competência conferida pelo § 3º do art. 177 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, no caso de companhias abertas e outras que optem pela sua observância;

II – realizar ajustes específicos ao lucro líquido do período, apurado nos termos do inciso I do caput deste artigo, no Livro de Apuração do Lucro Real, inclusive com observância do disposto no § 2o deste artigo, que revertam o efeito da utilização de métodos e critérios contábeis diferentes daqueles da legislação tributária, baseada nos critérios contábeis vigentes em 31 de dezembro de 2007, nos termos do art. 16 desta Lei; e

III – realizar os demais ajustes, no Livro de Apuração do Lucro Real, de adição, exclusão e compensação, prescritos ou autorizados pela legislação tributária, para apuração da base de cálculo do imposto.
Assim, o entendimento que se depreende da Lei é que deveria prevalecer a neutralidade fiscal, no que diz respeito aos procedimentos contábeis novos e que acabam por redundar positivamente ou negativamente no lucro a ser distribuído, em decorrência da sistemática da legislação. No entanto, na contramão deste entendimento, o Fisco, através do referido Parecer, sinaliza que se os efeitos contábeis novos produzirem resultado e forem distribuídos haveria hipótese de incidência de Imposto de Renda, em que pese não haver disposição legal para isso.

Há com isso, uma profunda incongruência entre o objetivo do texto legal, ou seja, a neutralidade fiscal em decorrência da utilização de novos procedimentos contábeis, e o parecer da PGFN que simplesmente ignora tal neutralidade.

Por Julio Cesar Maestri Quincozes

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