Sucessão: Os Desafios da Empresa Familiar

Não é novidade que um dos grandes desafios da empresa familiar é manter-se saudável e em crescimento com o passar do tempo e das gerações de acionistas, mantendo viva a chama da inovação e empreendedorismo de seu fundador. Fácil encontrarmos exemplos de empresas que desapareceram em decorrência da falta de habilidade de seus sócios ao enfrentar tais desafios, por outro lado, muito embora em número bem menor, existem também vários exemplos em sentido oposto: famílias empresárias que souberam identificar as armadilhas que se colocam no dia a dia da empresa familiar. Invariavelmente identificamos alguns pontos que são tratados de forma diferente entre essas duas classes de empresas – as que deram certo e as que não –, são eles:

Servir a empresa ou ser servido por ela?

Cabe ao fundador transmitir aos seus sucessores a crença de que a empresa nasceu e floresceu graças a todos os desafios superados, muitos dos quais mediante grande sacrifício pessoal e familiar. A iniciativa empresarial requer grande dose de desprendimento e compromisso para florescer. Utilização de seus bens para uso pessoal; realização de negócios sem uma análise aprofundada quanto a suas consequências e riscos; retiradas acima das capacidades econômicas da empresa; despesas desnecessárias; dedicação parcial ao negócio; disputas internas entre irmãos ou primos por poder, contratações que levam em conta interesses unicamente particulares; etc. são exemplos comuns dos erros cometidos pelos herdeiros que prejudicam sensivelmente o andamento normal dos negócios. Os herdeiros devem ter consigo a ideia de que a empresa não pertence exclusivamente a eles, mas também aos trabalhadores, credores, fornecedores e principalmente às futuras gerações.

Contratar parentes ou profissionais?

Como é notório, a empresa depende da qualidade de seus colaboradores, desde o chamado empregado de “chão de fábrica” até o mais graduado dos executivos, para realizar seu objetivo lucrativo. As chances dela realmente dar certo aumentam na medida em que esse time de profissionais for o melhor do mercado. Por mais privilegiados e bem preparados que sejam os membros de uma família, dificilmente todos eles terão aptidão e estarão preparados para ocupar cargos estratégicos na empresa familiar. As empresas familiares que dão certo têm uma regra fundamental quanto a esse ponto: todos os herdeiros devem ser treinados para serem excelentes sócios – donos do negócio. Somente os vocacionados terão a oportunidade de trabalhar na empresa, desde que detenham formação específica para o cargo pleiteado e sejam tratados desde a seleção até a sua permanência e promoção em pé de igualdade com os demais colaboradores. Claro que o sobremone pode e deve ser um fator de desempate; o que não deve ocorrer, isto sim, é a família incutir na mente do herdeiro a ideia de que ele “deve” trabalhar nas empresas da família, onde terá “emprego garantido”. O que dizemos é que todo o herdeiro deverá ser formado para ser sócio, mas somente aqueles efetivamente vocacionados e capacitados, além de sócios, estarão aptos a serem também administradores da empresa familiar.

  1. Ter regras claras sobre o relacionamento societário.
  2. A forma mais eficiente de prevenir litígios entre sócios familiares é construir um conjunto de normas de convivência aceitas por todos os familiares. Entre as mais importantes estão aquelas relacionadas com distribuição de dividendos; plano de carreira para membros da família; transferência de participações societárias entre familiares e entre estes e terceiros; quórum de deliberação diferenciado para questões pré-definidas; contratos de fornecimento ou prestação de serviços entre a empresa familiar e herdeiros ou agregados; contratação de auditoria independente; código de ética; aumento de capital, solução de litígios por meio de arbitragem, etc. Tais regras deverão estar refletidas num acordo de sócios discutido e aprovado por todos os membros da família empresária.
  3. Adoção das melhores práticas de governança corporativa.
  4. Com a constante evolução dos estudos sobre governança corporativa, que tem como pilares a equidade no tratamento dos sócios; responsabilidade corporativa; transparência e prestação de contas por parte dos gestores, é senso comum aqueles pontos fundamentais que devem ser observados pelas empresas na formatação de sua governança, entre eles temos o principal que é a criação de um Conselho de Administração como um órgão localizado entre os sócios e a diretoria executiva. Esse conselho deverá ser formado por membros da família e também por membros independentes, estranhos à família. Tais independentes são normalmente escolhidos entre profissionais experientes, com formação complementar em relação aos demais membros do conselho, que possuam perfil proativo, com comprovada idoneidade moral, financeira e ética. Não podem ter qualquer conflito de interesses com as atividades operacionais da empresa e nenhum outro vínculo profissional direto ou indireto com ela. Caberá ao conselho fundamentalmente decidir sobre quatro grupos de questões: estratégia do negócio; gestão de riscos, gestão dos talentos e monitoramento da gestão. Os fundamentos da Governança Corporativa podem ser observados no Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa desenvolvido pelo Instituto Brasileiro de Governança Corporativa – IBGC (ibgc.org.br).

É certo que cada iniciativa empresarial tem suas características próprias e cada família empresária, por sua vez, tem sua própria fórmula para tratar dos negócios. Não existem fórmulas prontas para a solução dos inúmeros problemas da empresa familiar. No entanto, cabe à família empresária observar com toda a atenção o que de comum existe entre os exemplos de sucesso e fracasso na condução da sucessão empresarial de maneira a aproveitar as boas práticas para superar o grande desafio que é conduzir os rumos da empresa familiar.

COORDENADORES DO SETOR DE DIREITO CORPORATIVO

Marcelo M. Bertoldi

Fábio Tokars

Gustavo Pires Ribeiro

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