Das incertezas que permeiam o redirecionamento das Execuções Fiscais e a aplicação do Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica

No que tange ao redirecionamento de execuções fiscais para pessoas jurídicas vinculadas ao contribuinte originariamente executado, verifica-se que o Superior Tribunal de Justiça há muito diverge quanto à necessidade, ou não, da prévia instauração do Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica (Disregard Doctrine), regulamentado pelo artigo 133 do CPC/15.

 

A 2ª Turma do STJ, ao julgar o REsp n. 1786311, cuja responsabilização tributária decorreu da sucessão empresarial por aquisição de fundo de comércio da empresa sucedida (art. 133 do CTN), entendeu pela desnecessidade de instauração do IDPJ para que o executivo fosse redirecionado à empresa integrante do mesmo grupo econômico, em síntese, por força de dois argumentos: a desnecessidade de instauração do IDPJ para o redirecionamento em face dos sócios deve atrair a mesma conclusão ao redirecionamento em face de outra pessoa jurídica, quando comprovadas práticas comuns/conjuntas do fato gerador, ou confusão patrimonial, vez que, nessa hipótese, não há individualidade das empresas envolvidas; bem como que a execução fiscal é regida por lei específica (Lei 6.830/80), razão pela qual a aplicação do IDPJ, previsto no CPC, não é automática.

 

Já a 1ª Turma do STJ, ao julgar o REsp n. 1775269, proferiu o entendimento de que, caso o pedido de redirecionamento do executivo mire pessoas jurídicas não elencadas na Certidão de Dívida Ativa, somente após a comprovação pelo Fisco da caracterização de hipótese de responsabilidade tributária de terceiros (arts. 134 e 135 do CTN), o magistrado pode decidir pela inclusão da pessoa jurídica no polo passivo da execução fiscal sem a instauração do IDPJ, vez que a responsabilização prevista no Código Tributário Nacional independe da desconsideração da pessoa jurídica devedora, atingindo diretamente os sujeitos eleitos pelo legislador.

 

Contudo, no julgado acima, foi feita a ressalva de que a referida conclusão não é adequada quando a pretensão fazendária de redirecionamento almeja pessoa jurídica integrante do mesmo grupo econômico a que pertence a sociedade empresarial originariamente executada que, além de não estar previamente indicada na CDA, não lhe é atribuída a responsabilidade na qualidade de terceiro. Isso porque, de acordo com a 1ª Turma, só o fato de integrar grupo econômico não torna uma empresa responsável pelos tributos inadimplidos por outras, dependendo, portanto, da comprovação do abuso de personalidade, caracterizado pelo desvio de finalidade ou confusão patrimonial, de acordo com o art. 50 do Código Civil. Por essa razão, nesta hipótese, é obrigatória a instauração do incidente de desconsideração da personalidade da empresa devedora.

 

Inobstante a oposição de Embargos de Divergência pela União no REsp n. 1775269 para o esclarecimento do posicionamento da Corte Superior, cujo julgamento causou uma grande expectativa na solução do entrave, o STJ, ao julgar o caso neste ano, entendeu pela ausência de similitude fática entre os posicionamentos que seriam divergentes, fundamento processual pelo qual os Embargos foram indeferidos, frustrando, novamente, os contribuintes, ante a ausência de um desfecho satisfatório.

 

Desta forma, tendo em vista a não definição de um entendimento pacífico no STJ, remanescem as incertezas que assombram os possíveis sujeitos passivos, seja porque na prática a pretensão de responsabilização do Ente Fazendário, não raro, é desprovida de provas concretas da caracterização das hipóteses de responsabilidade tributária, seja porque restam obscuros quais procedimentos devem ser instaurados no feito antes do redirecionamento do executivo, a depender a situação fática posta em análise, em manifesta afronta aos princípios da ampla defesa e contraditório, assim como ao princípio da segurança jurídica.

 

 

Fernanda Luiza Tumelero é pós-graduanda pelo IBET e advogada tributarista do escritório Marins Bertoldi Advogados.

 

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